Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas / Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil |
As lições de quem ficou pelo caminho: o que ex-governadores de SP podem ensinar a Tarcísio?

As lições de quem ficou pelo caminho: o que ex-governadores de SP podem ensinar a Tarcísio?

O JOTA conversou com personagens envolvidos nas campanhas de 2006, 2010, 2014 e 2018; o último governador que se tornou presidente foi Jânio Quadros


Beto Bombig

Uma das máximas da política brasileira diz que basta sentar-se na cadeira de governador do Estado de São Paulo para ser alçado automaticamente à condição de presidenciável. Desde a redemocratização (1985), para além das cotações e sondagens, foi assim com Orestes Quércia, Geraldo Alckmin, José Serra e João Doria.

Em 2000, Mario Covas também era lembrado para a sucessão do então presidente Fernando Henrique Cardoso, ambos no PSDB, mas o então governador morreria, vítima de um câncer, no ano seguinte.

Neste ano, Tarcísio de Freitas (Republicanos) se encontra às voltas com angústias e desafios semelhantes aos enfrentados por seus antecessores. Afinal, com mais ou menos intensidade, quase todos os que acalentaram o sonho de chegar ao Palácio do Planalto a partir do Bandeirantes experimentaram o dilema quase shakespeariano de disputar a reeleição ou tentar a Presidência.

O JOTA conversou com diversos personagens envolvidos diretamente nas campanhas eleitorais de 2006, 2010, 2014 e 2018 para saber quais lições os ex-governadores de São Paulo podem transmitir ao atual inquilino do Bandeirantes, afinal, o último governador de São Paulo que se tornou presidente do Brasil foi Jânio Quadros, que comandou o estado de 1955 a 1959 e foi eleito presidente em 1960.

Se o cavalo passar selado, monte nele

Em 1989, Orestes Quércia era o poderoso governador de São Paulo e queria disputar a Presidência, mas seu MDB tinha o histórico Ulysses Guimarães, baluarte da redemocratização, como "candidato natural".

Mesmo bem avaliado e sabedor de suas potencialidades, pois possuía o apoio de vários setores do MDB e de outros governadores, Quércia escolheu terminar o mandato e deixou o cavalo passar selado, desistindo de enfrentar internamente no partido o velho cacique, que ficou apenas em sétimo lugar na disputa presidencial.

Em 1994, quando, finalmente, disputou o Planalto, já fora do Palácio dos Bandeirantes, Quércia ficou em quarto lugar, com menos de 5% dos votos, praticamente o mesmo percentual de Ulysses em 1989.

Cuidado com a divisão no seu campo político e nunca ache que Lula está manco e fora do jogo
A crise do mensalão, em 2005, colocou o PT na lona a ponto de ter sido cogitado o impedimento de Lula, naquela altura considerado o que americanos chamam de "pato manco" (político avariado e sem força). Dentro do PSDB, principal sigla de oposição, a decisão foi deixar o governo sangrar até o fim e derrotá-lo nas urnas. Geraldo Alckmin, então governador de São Paulo em 2º mandato, travou uma disputa interna com José Serra pela candidatura presidencial e, para vencê-la, anunciou que se desincompatibilizaria no prazo da lei mesmo sem a garantia de que seria o candidato ao Planalto.

Serra, então prefeito de São Paulo, recuou e aceitou disputar o governo paulista. Mas, o PSDB já estava dividido e Lula começava a se recuperar do mensalão com a ajuda da economia. Alckmin iniciou a campanha sem o apoio necessário dos tucanos, que, naquela altura, já contemplavam o "pós-Lula" e se dividiam em outros projetos individuais de poder.

Alckmin conseguiu chegar ao 2º turno, mas teve menos votos do que no 1º, enquanto Serra venceu com facilidade a disputa pelo Bandeirantes, e Aécio Neves se reelegeu governador de Minas. Ambos se tornaram, automaticamente, presidenciáveis preferenciais. Alckmin voltou para o fim da fila. Nos bastidores, muita gente acusou Serra e Aécio de terem feito "corpo mole" pensando em seus projetos pessoais. Ambos negam até hoje.

Trocar uma reeleição garantida é arriscado, mas esperar o "pós-Lula" também não garante sucesso
Quatro anos depois, em 2010, Serra tinha uma reeleição praticamente garantida em São Paulo, mas, após grande hesitação, avaliou que, com Lula fora da eleição, teria grandes chances de vencer Dilma Rousseff. Ou seja, Serra avaliava que no "pós-Lula" o PT perderia força.

Em fim de 2º mandato, Aécio era um "candidato natural" e chegou a impor alguma resistência ao projeto presidencial do então governador de São Paulo, mas aceitou concorrer ao Senado por entender que o potencial de transferência de votos do então presidente Lula ainda era muito grande, pois sua gestão estava bem avaliada, e que Dilma seria um candidata altamente competitiva.

Serra conseguiu chegar ao 2º turno, mas terminou derrotado e ficou quatro anos sem mandato. Geraldo Alckmin foi eleito governador de São Paulo. Aécio chegou ao Senado como o próximo "candidato natural" a presidente pelo PSDB, o que acabou ocorrendo em 2014.

Centrão não garante votação expressiva; é preciso saber "ler" os ventos

Em 2018, Alckmin partiu para sua segunda tentativa de chegar ao Planalto. Diferentemente de 2006, o então governador de São Paulo construiu um arco de apoios partidários expressivo, ancorado no chamado Centrão: DEM (atual União Brasil), PP, PR, PRB, SD, PTB, PSD e PPS. Tinha tempo de TV e estrutura de campanha.

Os ventos na política brasileira, no entanto, já haviam mudado com os efeitos da Operação Lava Jato e a ascensão de Jair Bolsonaro, até então, um deputado federal do chamado "baixo clero" da Câmara. Com a radicalização dando o tom da campanha, o moderado Alckmin ficou em 4º lugar no primeiro turno.

Bolsonaro venceu Fernando Haddad no 2º turno. O PSDB perdeu espaço para o "bolsonarismo" na polarização com o PT.

Romper com Bolsonaro e antecipar campanha não são um bom negócio

Eleito governador de São Paulo em 2018, João Doria, então no PSDB, rompeu com Jair Bolsonaro, a quem havia se aliado em 2018 para se eleger, por conta de divergências na pandemia da Covid-19. No entanto, apesar das questões envolvendo o combate ao vírus, o mundo político já sabia que o ocupante do Palácio dos Bandeirantes era postulante ao Planalto e teria de enfrentar o então presidente.

Doria virou alvo preferencial do bolsonarismo e foi perdendo apoios em outros partidos por antecipar a campanha eleitoral e escancarar o desejo de chegar ao Planalto em 2022. Quando percebeu que não seria mais candidato a presidente, tentou permanecer no Bandeirantes e concorrer à reeleição. Porém, por conta de um acordo fechado anteriormente com aliados, teve de sair do palácio. Assim, apesar de ter feito uma gestão bem avaliada, Doria acabou deixando o cargo em abril daquele e ano e não disputou a eleição.

Por fim, um traço comum a esses antecessores e ao atual governador é o fato de que uma gestão bem avaliada pela população de São Paulo (Tarcísio tem algo em torno de 60% de aprovação conforme as mais recentes pesquisas, mesma média histórica dos governo tucanos) é boa base de lançamento rumo ao Planalto, mas não garante uma vitória.logo-jota

Jota
https://www.jota.info/executivo/as-licoes-de-quem-ficou-pelo-caminho-o-que-ex-governadores-de-sp-podem-ensinar-a-tarcisio